Poema:
Olhando pela janela, imagine a noite perfeita: uma lua crescente, estrelas a brilhar. Uma sopa quentinha. Um banho relaxante. Em seu quarto, a luz delicada do abajur de porcelana convida ao descanso, enquanto um perfume suave de lavanda lhe faz cerrar os olhos. Ao seu lado, um trator. Sim, seu grande amor ronca feito uma britadeira e, claro, adormece antes de você.
Motivo de insônia e irritação de parceiros – e talvez até a pimenta para o divórcio – o ronco já nasceu para incomodar. Até o som da palavra é a própria onomatopéia do terror noturno, do acelerador da moto, do barulho do engasgo que assusta quem vê e ouve (e, às vezes, filma com o celular, afinal não se pode perder a piada).
Brincadeiras à parte, o ronco pode ser um dos principais sinais de uma doença que vem provocando enorme alarde na Cardiologia: a Apnéia Obstrutiva do Sono (AOS). Atualmente, entendida como o novo fator de risco cardiovascular (assim como tabagismo e diabetes), tem sua devida importância no fato de causar aumento da pressão arterial, isquemia cerebral, infarto no coração, arritmias cardíacas e até morte súbita. E isso acontece por que, para cada episódio de apnéia (que é a parada respiratória, quando a gente olha a pessoa dormindo sem respirar), existe uma reação do organismo para estimular a respiração, que é aquela “roncada” forte, típica de quem está sufocado e faz força para puxar o ar. Essa carga de adrenalina, que pode ocorrer várias vezes durante o sono, prejudica todo o sistema cardiovascular durante as 24h do dia, e não somente no momento em que ocorre a apnéia.
A AOS pode ser causada por alterações anatômicas que obstruem as vias aéreas, mas, com muita frequencia, está relacionada ao aumento de peso. É mais comum em homens com sobrepeso ou obesidade, entretanto pode ocorrer em mulheres e pessoas magras, por tantas outras causas.
Pessoas que roncam muito e se sentem cansadas o dia todo, que adormecem em salas de espera ou filas, devem suspeitar da existência de AOS. A polissonografia é o exame de escolha para este diagnóstico, pois monitora diversos parâmetros do sono, e pode ser realizada dentro de clínicas especializadas ou mesmo em casa, a depender do tipo de exame disponível. O tratamento pode ser feito com o uso de CPAP ou cirurgia, dependendo do caso.
Quem tem AOS fica doente. Não dorme um sono profundo, tem alterações hormonais e pode ter complicações gravíssimas relacionadas ao coração. Portanto, não é apenas um probleminha de sono. Pode, sim, comprometer a vida e merece tratamento adequado. E, de quebra, o tratamento pode melhorar a rotina do casal e o humor de todos que dormem na casa.